AGNUS DEI:
A PÁSCOA, O CORDEIRO PASCAL
E A RESSURREIÇÃO
“Agnus Dei, qui tollis peccata mundi, dona
nobis pacem”
– Cordeiro de Deus, que tirais o pecado do
mundo, tende piedade de nós. –
Uma Páscoa Agridoce
Há uma antiga lenda contada pelos homens do passado, que
Alboino, rei dos lombardos, estava
furioso em meio a uma guerra, especialmente aquela travada no norte da Itália
na região da Lombardia, no vilarejo de Pavia. A pequena
cidade resistiu ao ataque de seu exército,
e após a invasão ele buscava vingança devido à resistência. Porém um padeiro
local lhe deu de presente um iguaria
em formato de pomba, trazendo enfim paz àquele conflito. A guloseima acalmou o rei lombardo e ele
desistiu da vingança. Essa é a origem da lendária Colomba Pascal, a qual trouxe um fim doce e de paz para as
pessoas daquele vilarejo.
Assim, como a
lenda da Colomba Pascal é passada de geração em geração, século após século,
também a história
do coelhinho, seus ovos coloridos
e as muitas doçuras de chocolates,
têm tomado o lugar do verdadeiro sentido da Páscoa.
O final da lenda do rei lombardo e do padeiro, foi deveras
doce. Mas quero falar de uma “Páscoa agridoce”, sim, que em sentido figurado, é agradável e
desagradável ao mesmo tempo, algo
como uma mistura de doçura e amargura. Agradável, porque agradou a Deus sacrificar o Cordeiro e o Cordeiro,
agradou ao Pai a se entregar por mim e por você.
Desagradável pois desagradamos o Pai, pecamos
contra Ele e, ao invés de moer o Cordeiro,
os moídos naquela Cruz eram para ser eu e você.
Amargo, porque no Éden, fomos condenados ao amargor da
morte e, não há nada, nada que façamos
para pagar o sacrifício do Cordeiro. Desde o Éden, não havia na terra um justo, nenhum sequer, ninguém que fizesse o bem,
todos se extraviaram e estavam destituídos da
Glória de Deus. Mas, doce porque Ele é Jesus, seu nome é doce, sua
presença é doce. Oh, doce presença!
Esse é o nosso Salvador, o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. Ele amargou a humilhação de se tornar homem
como eu e você, tomou o nosso lugar, para trazer uma doce paz, aquela que este mundo não pode nos dar! A paz
com Deus!
O Cordeiro Pascal
Embora foi um contexto muito triste e sombrio da história do homem, eu me interesso em estudar e ler livros, artigos, revistas, bem como, assistir filmes, séries e documentários sobre a Segunda Guerra Mundial. Algo que me achama atenção em alguns filmes, especialmente aqueles que reproduzem os acontecimentos dos campos de concentração nazista, é que os judeus, mesmo nos dias de turbulência e perseguição pelo regime, ou até mesmo quando precisaram se esconder, eles se reuniam com a família para o Shabat, no qual descansavam, oravam e comiam a luz de velas. Outro momento que me chama também muita atenção, é que além do Shabat, eles também se dedicavam e faziam o possível para observar o Pessach (que é a expressão hebraica para Páscoa). Os judeus ainda observam a Páscoa, sendo que aonde quer que haja um judeu, há a comemoração da mais importante data para aquele povo e sua religião.
Na minha viagem à Alemanha, eu estive em um dos piores campos de concentração da Segunda Guerra Mundial – o Campo de Dachau. Essa foi uma viagem também de sensação agridoce. Ao mesmo tempo que sentia a alegria de estar pisando na Alemanha de reformadores como Lutero e Melanchton, eu estava presenciando evidências e fatos de uma terrível barbárie, que foi comandada pelo führer Adolfo Hitler.
Como disse o pastor e teólogo Igor Miguel: “A Páscoa
cristã é herdeira da páscoa dos judeus. Um dos feriados mais importantes do calendário cristão,
também está entre os mais importantes do calendário judaico.
Porém, entre cristãos,
a Páscoa teve seu sentido
concentrado no evento do sofrimento, crucificação, sepultamento e
ressurreição de Jesus Cristo."
Essa é uma importante referência e conexão, e o mesmo pastor continua dizendo
que: “As conexões entre a páscoa
dos judeus e a páscoa cristã são fortes e quase indissociáveis. Jesus é identificado no Novo Testamento e
na tradição cristã como o 'Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo (Jo 1.29), também uma referência ao
cordeiro que era sacrificado durante
a Páscoa judaica. Jesus Cristo se torna então o perfeito “cordeiro sem defeito
de um ano” (Ex 12.5), que foi
entregue pela libertação do povo” (lecionario.com).
Mas por que celebrar a Páscoa? Qual a diferença entre a que
nós celebramos e a Pessach, que ainda
é comemorada pelos judeus? Que verdades aprendemos na Pessach contada em
Exôdo? O querido pastor e escritor
John Stott, nos ajuda com essa pergunta:
“Para os cristãos, Jesus Cristo é 'o Cordeiro de
Deus' acerca de quem podemos afirmar: 'Cristo, nosso Cordeiro pascal, foi sacrificado. Por isso,
celebremos a festa' (1Co 5.7-8). Podemos
aprender muitas verdades com essa história. A primeira é que o Juiz e o
Salvador são a mesma pessoa. O Deus
que atravessou o Egito para julgar os primogênitos é o mesmo Deus que passou por sobre as casas dos
israelitas, protegendo-os da morte. Não podemos caracterizar o Pai como Juiz e o Filho como Salvador. É o mesmo
e único Deus que nos salva do juízo
através de Jesus Cristo” (A Bíblia Toda, O
Ano Todo)
Não precisamos mais separar, preparar ou sacrificar um
“cordeiro sem defeito” na Páscoa, pois Ele, Jesus
é o Cordeiro de Deus, o Cordeiro sem defeito, já fez isso de uma vez por todas, separou-se – solitário venceu e, na Cruz Ele subiu. Ali, Ele foi o Sacerdote e o Cordeiro, o Sacrificador e o Sacrifício.
Ele é o verdadeiro Cordeiro Pascal.
A Ressurreição
Na narrativa do Evangelho de João, vemos que Jesus nasceu, cresceu, foi batizado, pregou as boas novas, foi humilhado, sofreu, cuspiram nele, o açoitaram, percorreu a via dolorosa, carregou a Cruz, morreu naquele símbolo de maldição que carregou, mas por fim, ressuscitou. Apareceu a Maria Madalena, apareceu aos discípulos, tendo as portas do recinto trancadas, diga-se de passagem, o que deixou, na verdade, todos os discípulos atônitos. Ao que logo que apareceu no meio deles, disse Jesus: “Paz Seja Convosco.”
Após passar por todos os acontecimentos, ser traído, açoitado, fazer a vida dolorosa, levar a Cruz e ser crucificado, Ele aparece e diz isso: Paz seja convosco! Ele poderia dizer:
– Pedro você me negou, você não me
amava?
Mas não! Ele disse: – Paz seja
convosco!
Esse mesmo Jesus, que apareceu aos discípulos, nos dias que
a angústia nos toma, que as tristezas
amargas dessa vida terrestre sobrevém, que as inquietações agitam a alma, que
uma guerra instalada na mente rouba a esperança e alegria, continua
nos dizendo: – Paz seja convosco!
Há uma cena importante e sensacional ainda no capítulo
20 de João. Vimos que Jesus apareceu aos discípulos. Mas Tomé não
estava (v. 24). O texto diz que
passados 8 dias da última aparição de
Jesus, evento no qual Tomé não estava; outra vez ali reunidos – Tomé, o discípulo incrédulo e duvidoso agora está
(v. 26). Agora Tomé está. Isso é
intrigante, parece loucura, pois observe quem Jesus chamou
para ser seu discípulo: um traidor, um terrorista, um cobrador de impostos, simples
pescadores e agora vemos na cena um duvidoso, Tomé, chamado Dídimo.
Embora, toda a esfera de dúvida ali retratada, Jesus pede
para Tomé tocá-lo – põe aqui o dedo e
vê minhas mãos! Toque a mão e coloque no meu lado! Sim o Cordeiro sem defeito,
o Cristo ressuscitou, ressurgiu dos
mortos, mas não perdeu suas feridas. Ele venceu a Cruz, Ele é poderoso para ressuscitar, ressurge, mesmo
assim carrega suas feridas – o histórico de sua dor na Cruz. A morte e a ressurreição de Cristo não anularam, não
passou um corretivo, não tirou as
suas feridas.
Lembro-me que em “As Crônicas de Nárnia” de C. S.
Lewis, Suzana e Lúcia, ao verem Aslam
ressuscitado após sua morte na mesa de pedra, ficaram espantadas e foi preciso
que Aslam lambesse seus rostos para
terem certeza que não era um fantasma.
E após tocar suas feridas,
Tomé exclama surpreendentemente uma das maiores
afirmações de toda a Bíblia, a qual é essencial
para nossa fé cristã e para todo verdadeiro cristão: – Senhor meu e Deus meu! Ele é Deus e Homem.
Somente alguém Santo
poderia se sacrificar em nosso lugar,
um Cordeiro sem mácula, e Santo somente
Deus. Mas, também
o pecado foi cometido na carne, teria que ser pago na carne – por um homem.
Sim, Cristo Jesus, Homem,
nosso único Cordeiro
e Mediador perante
Deus (1 Tm. 2.5). Tomé precisou tocar no
Cordeiro! Mas esse Cordeiro, que nos livrou
do pecado e da morte,
disse a ele: – Bem aventurados, ou seja, felizes
são os que não viram e creram! Eu e você
não vimos o Cordeiro, não vimos o Cristo Ressurreto, mas mesmo
assim cremos nEle, porque Ele nos viu primeiro!
“Faça
a sua escolha, ou esse homem era, e é, o filho de Deus, ou não passa de um
louco ou coisa pior. Você pode querer
calá-lo por ser um louco, pode cuspir nele e matá-lo como a um demônio;
ou pode prosternar-se a seus pés e chamá-lo de Senhor e Deus. […] Agora, parece-me óbvio que Ele não era nem um
lunático nem um demônio, consequentemente, por
mais estranho, assustador e inacreditável que possa parecer, tenho que
aceitar a ideia de que Ele era e é
Deus.” (Cristianismo Puro e Simples)
Solus
Christus!
Ad maiorem Dei gloriam!
Em
Cristo, em Fé, Esperança e Amor:
Levi Elias de
Almeida Ceccato, esposo, pai, professor e escritor.
Presbítero da Primeira Igreja Presbiteriana do Brasil em Rio Claro - SP.
Licenciatura em História pelo Centro Universitário Claretiano. Bacharel em
Teologia pelo Seminário Reformado ESUTEL. Pós-graduando Especialização em
Educação Cristã, no Centro Presbiteriano de Pós-graduação Andrew Jumper - CPAJ.
Host do PodCast - Coram Deo. Autor da série “Um
Conto do Ordinário”, original Pilgrim. Editor da João Calvino Publicações.
Amante da boa literatura e da Teologia serva de Deus.
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